terça-feira, 8 de maio de 2012

hoje pela manhã, quando deitava o café na xícara, percebi que era aquela que você me deu, com palavras de amor. faz tanto tempo, parece que foi ontem. a xícara que você me deu está durando mais tempo na minha vida do que você.
eu sinto a sua falta ainda. não todos os dias mas eu sinto. principalmente quando estou triste. não posso dizer que você antes 'estava ali pra mim' nos momentos difíceis. mas era com quem eu podia falar que estivesse pensando, sobre meus problemas, o que se passava no meu dia... com você, e você era e ainda é o único, eu podia conversar sobre qualquer assunto, menos um: nós.
nós costumávamos ser tão parecidos quando jovens. tínhamos tanto em comum. mas você mudou. eu mudei. tivemos timings diferentes. você me quis quando éramos crianças. eu te quis quando eramos velhos. disso eu me arrependo. porque se eu tivesse visto nos seus olhos o encanto que vi mais tarde, quando ainda tínhamos aquela esperança adolescente, nós poderíamos ter vivido algo muito especial, mágico até, que só acontece antes que a vida nos deixe cheios de cicatrizes. não que isso não fosse durar apenas um instante, mas seria bonito.
passou. eu me tornei amarga, você se tornou seco. não existia esperança alguma pra nós. mas eu ainda sim quis me iludir.
é tudo tão mais fácil sem você. porque você era o único com quem eu parecia me importar. eu não me importo mais com o que os outros pensam, eu não me importo em dizer a eles o que eu penso. eu não me importo. eu não quero conversar. eu simplesmente os deixo falando sozinhos e vou embora. mas com você era diferente. e era isso que doía. eu queria me explicar, queria te convencer, queria que você soubesse, queria mais de você... então vinham os desentendimentos. e eu me magoava tanto, tanto... porque você era o único que tinha acesso ao meu coração gelado e no fundo eu sou totalmente abalável e frágil... só a pessoa que a gente mais ama pode nos machucar tanto. eu nunca mais vou gostar de alguém como gostei de você. porque você me pegou em branco. 
não foi a vida quem nos separou, fui eu. por acidente e de propósito. eu sabia que longe ia ser mais fácil. eu não gostava da pessoa que eu era quando estávamos juntos. aquela não era eu e ainda não sei porque me transformava naquilo. talvez minha tentativa desesperada de lhe chamar a atenção. but it is what it is. there is no turning back. não espero que nada disso mude, que o tempo volte. é isso. esse é o nosso desfecho. 
quando nós ainda tínhamos a inocência de dizer 'eu te amo', costumávamos complementar com a expressão 'pra sempre'. 'Eu te amo. Pra sempre', você disse. está escrito ainda naquele papel que você me deu. aquele que eu guardo até agora. junto com a caneca, as fotos e até um saquinho de adoçante. e não era mentira, nada daquilo era mentira. acho que até que nisso continuamos concordando. pode ser meu último suspiro otimista mas eu acho que você ainda sente isso. e eu também. eu também ainda te amo. pra sempre.

terça-feira, 28 de julho de 2009

Olhar pelas luzes da cidade através do vidro embaçado, respingado da chuva incessante.
O rosto se ilumina, se apaga, se ilumina, o eterno jogo.
Quem saberia? Quem iria dizer? Uma noite corriqueira de julho, chuvosa e entediante, seria o dia mais importante de sua vida?
O insulfilme esconde dentro do carro preto a face confusa. Os olhos suplicam um herói, mas ninguém sequer os vê. Os lábios fixos, não se mexem, não saberiam expressar em palavras todo o turbilhão que se esconde dentro desse muro contido. E se rebate violentamente lá, presa.
Dirige mecanicamente, checa os espelhos mas nada vê. A rotina tão monótona parece ditar até mesmo os semáforos vermelhos e as músicas da rádio. As pessoas são as mesmas, as barberagens no trânsito são as mesmas, nada a surpreende, nada a arrebata, a não ser ela mesma, urrando sem sentido, sem motivo.
Duas, três, quatro quadras... O caminho é curto. O espaço é pouco. Pouco demais, pra nós três, baby. Eu e você. Eu e você, Solidão. Eu e você, Melancolia. Meu casamento bigâmico.
Uns músculos levemente tensionados, as pálpebras se fecham com mais força, as rugas que em breve apareceriam...
Novamente se abrem. O sinal verde já espera. Engata primeira.
Tudo brilha. Não, é escuridão. É tão silencioso dentro do caos. São os cacos de vidro refletindo os neons, girando em todas as direções, entrelaçando pelos cabelos, tocando violentamente a sua pele.
A visão periférica, os milésimos de segundo que seus olhos tiveram para avisá-la antes que tudo entrasse em slow motion, antes que o metal gemesse, antes que a fatalidade se realizasse.
E pode sentir delicadamente a aproximação de seu algoz, como dedos amorosos tocando seu braço numa manhã preguiçosa, o despertar lânguido de um sonho pouco agradável. É quase bom, seria bom se não doesse tanto, cada osso esmagado, cada órgão pressionado.
E o objeto de sua adoração, pode vê-lo por um lampejo. Eram olhos verdes escusos por um cabelo preto. Eram sérios e determinados. Era esse o encontro que ambos esperavam, estava escrito, destino. Eles eram soulmates. O amor à primeira vista, arrebatador, correram na direção um do outro a 100km/h, não podiam esperar, era urgente, eles precisavam se unir, se atrairam de forma irreversível. Nenhum deles piscou, nenhum deles demonstrou medo ou arrependimento. De cabeça erguida, mergulharam para seu amor destruidor. O êxtase foi momentâneo, mas qual êxtase de amor dura mais do que um instante? E foi pleno. Foi inteiriço e confortável, como fazer o que se nasceu pra fazer. Como estar no colo de um companheiro, ele a abraçou, com suas extensões plásticas, metálicas, industrializadas em série. Ele flechou seu coração, transpassou seu corpo, mudou sua vida para sempre.
Ela havia esperado por esse momento, tão ansiosamente. Pensado nele todas as noites antes de dormir, pedido a vários deuses de vários credos. E quando seus olhos viram os olhos dele, ela soube, ela foi feliz. Eles foram um só.
Os cabelos voando desgrenhados, o cinto de segurança prendendo seu corpo enquanto o parachoque dele vinha ao seu encontro, as mãos soltando do volante. Os carros girando pela rua, como numa valsa, o homem guiando a mulher, o próximo passo, o próximo número, a coreografia certa. E os pneus cantando foram música. E tudo em volta se tornou um borrão, esquecido frente a importância desse acontecimento, esse primeiro beijo apaixonado entre dois amantes. O amor dói.
Ela sabia que quando ele chegasse, ele mudaria sua vida, acabaria com todo esse sofrimento. Ela estava certa, sempre esteve.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

Sobre romantismo


Eu estava tendo um dia muito feliz até o momento em que me dispus a ler um livro romanticuzinho-piegas. A história era a de sempre: a mocinha traumatizada por um homem mau do passado tem medo de se entregar a um cara que a venera e a ama incondicionalmente; ele insiste até que ela finalmente perceba o que está perdendo e vivem felizes para sempre. Então eu fiquei deprimida, estragou de verdade o meu dia. E me perguntei o porquê. E a resposta é mais ou menos essa:

Demorei, demorei pra admitir pra mim mesma que sou sim uma romântica.
Quando tinha uns 15 anos, um amigo disse que se eu não encontrasse meu grande amor até os 19, nunca encontraria. E, apesar de ter achado besteira, concordava um pouco com ele.
Tempos passaram e me vi em relacionamentos que abominavam o romantismo. E eu realmente abominava. Detestava melodrama, apelidinhos, foram poucos os eu-te-amos e eu não sentia falta, era assim porque eu queria. Eu era um pouco mais velha que uma considerada adolescente, mas sempre fui 'do contra'. Nunca acreditei no amor. Quer dizer... Eu acredito que pessoas possam se amar, mas acho que esse sentimento é uma troca de conveniências, as pessoas fazem coisas exatamente pra que as outras as amem e essas respondem da mesma forma. E quando essa 'farsa' acaba, o amor também. Sim, sou pessimista.
Mais alguns anos vieram, mais pessoas cruzaram o meu caminho...
E parei pra pensar na cronologia da minha vida amorosa e percebi que depois dos 19, ninguém realmente me encantou: os amores platônicos que me acometeram nos últimos 3 anos foram de pessoas que conheci antes disso ou mesmo de lembranças de como elas costumavam ser quando éramos mais novos.
Então me dei conta de que não gosto dessas comédias românticas porque, pra mim, elas são extremamente inverossímeis. Não gosto de ler livrinhos de amor porque eles nunca acontecem na vida real e me deixa muito triste querer, sim, que um homem faça comigo o que os gentlemen apaixonados fazem por suas frágeis mocinhas.
No fundo, eu sou uma romântica pessimista. Não acreditando que nada disso seja possível mas querendo (desde sempre) que me provem que estou errada.

terça-feira, 12 de maio de 2009

Primeiro escuridão. Então luzes. São flashes e neons. Agora música. Alta o suficiente pra afastar pensamentos, a batida massageia os órgãos e convence o corpo a se deixar levar.
O olhar ao redor, procurando alguém que se destaque, o strobo faz ver em slow motion. Todos são mais bonitos do que à luz do sol. Todos são mais interessantes, descolados, bem vestidos. Os espelhos refletem os egos inchados, as poses, os fakes, os cabelos milimetricamente despenteados e as roupas propositalmente descombinadas. Todos dançam tentando convencer o próximo de que não se importam, como se não houvesse mais ninguém na pista.
Caminha até o bar. Procura no cardápio o maior teor alcoólico pelo menor preço. O copo é o ponto de equilíbrio, sem ele, os braços não sabem o que fazer. Um brinde alegre pela noite. O primeiro gole em baixo das sobrancelhas erguidas ainda buscando um alvo.
Encontra um lugar na pista. A música é qualquer uma artificial, não conhece e não quer saber. Dança no ritmo proposto com a face blasé dress code. Está quente e abafado, a fumaça dos cigarros, o ar condicionado fraco.
O drink termina. Precisa de outro. Desta vez um shot pra fazer efeito mais rápido e uma long neck pra manter-se. Mais alguns minutos na pista e o álcool começa a fazer efeito: a música melhorou, o humor está mais amistoso, surge um leve sorriso no rosto, o corpo dança com mais excitação. As investidas são menos tímidas e mais diretas. Encontra uns interessantes na multidão e monitora-os ao mesmo tempo.
São olhares, meneares de cabeça, movimento de cabelos... Demora um pouco, alguns sequer a notam, mas um deles caiu em sua isca. Finge um pouco de desentendida e realmente se pergunta qual o próximo passo a se tomar. Todas as possíveis reações passam por sua mente, a maioria pessimistas. Mas ele se encarrega e vem até ela. Uma conversa fatica na qual fingem não se ouvir pra poder aproximarem seus rostos, seguem o protocolo do nicetomeetyou, ele se oferece pra lhe trazer uma bebida. Depois dançam se exibindo e ela sente a mão dele posar em sua cintura, procura o rosto dele perto de seu cabelo com a mão por cima do ombro e ele a beija no pescoço. Ela se vira, leva seu nariz em direção ao dele mas antes que se toquem, ele já a beijou. Desajeitadamente sentem o gosto um do outro, estranham os gestos, forçam-se a se acostumar. Logo esgueiram-se para os estofados laterais e continuam a se conhecer. Esquecem completamente as companhias com que vieram e dedicam-se apenas um ao outro.
O tempo passa. Com ele, sussurrado ao pé do ouvido, um convite. Ela recusa a principio, mas sabe exatamente a hora de aceitar. Pagam suas comandas, pisam na calçada e um vento gelado arrepia seus braços. Colados andam até o carro.
O caminho curto é repleto de malícias, beijos rápidos e ardentes, mãos deslizantes e olhares sujos. Estacionam. Descem do veículo e usam-no como apoio para um abraço mais atrevido. Logo dirigem-se a uma porta de vidro e pedem um quarto no balcão.
Risinhos no elevador.

[continua]

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Um baú. Vazio.
Todas as noites ela olhava para o objeto de madeira maciça, pesado, antigo... Aos pés da cama, às vezes esbarrava nele, no escuro, acidentalmente. Às vezes se sentava em sua tampa e olhava o céu pela janela.
Hoje, tinha os olhos fixos nele. O verniz reluzia como se fosse novo e, na verdade, não poderia ser considerado velho, pois fora pouco usado.
Acompanhava-a desde que se lembrava. Esteve ao seu lado nas noites insones e nas passagens rápidas pelo quarto, nos momentos alegres. Viu coisas que mais ninguém viu. E foi seu grande confidente.
Eram suas paredes que protegeram do mundo exterior a materialização de sua alma. Era seu coração fora do peito. Era nele que guardava cartas de amor, letras de músicas, fotos queridas, velhas fitas de cetim que um dia embrulharam presentes.
E estava vazio. Há meses. O passado tornou-se passado demais pra ser guardado em um lugar tão ao alcance da mão. O presente, entretanto, zombava-a com espaço demais. Desafiava-a e jogava em sua cara sua incapacidade de preenchê-lo.
E ela soluçava se explicando, dizendo que não era sua vontade, esteve se esforçando, mas... A vida havia conspirado para que esse vazio, tão perturbador, se estabelecesse.
E desejava, quase em súplicas, que houvesse novamente um bom motivo para usá-lo.

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

-Alô?
-Hm... Alô?
-Oi, sou eu. Tava dormindo?
-Ahn, é... É o que eu costumo fazer as duas e meia da manhã...
[suspiros]
-Então... Diga.
-Ah, é que eu preciso te pedir um favor...
-O quê?
-Você pode vir me buscar?
-Te buscar? Onde?
-Estou aqui na avenida xis.
-Agora?
-É, sim... Você pode vir, por favor?
-Você não tem como ir pra casa?
-Não... Acabei de brigar com ela, não posso ficar... E não tenho dinheiro pro taxi...
-Não tem nenhum amigo seu que more aí perto?
-Não... Ninguém me atende... Todo mundo deixa o telefone no vibratório... Você é a única que sei que atenderia.
[suspiros]
-Não sei se posso ir... Sair a essa hora... Teria de dar uma satisfação pra pegar o carro...
-Por favor?

Alternativa A-)

Ela se levanta, troca de roupa, pega a chave e sai, com a mãe ligando atras, perguntando que loucura é essa de sair esse horário. A noite está um pouco fria e vazia. Percorre os quilometros até que rapidamente. Chega no lugar xis, mas ele não está. Liga no celular dele 7 vezes antes que ele atenda. Ele lhe responde:
-Oi. Ela desceu e me falou pra subir. Falei que você estava vindo, mas ela quis fazer as pazes. De qualquer forma, valeu.

Alternativa B-)
Ela se levanta, troca de roupa, pega a chave e sai, com a mãe ligando atras, perguntando que loucura é essa de sair esse horário. A noite está um pouco fria e vazia. Percorre os quilometros até que rapidamente. Chega no lugar xis, mas ele não está. Liga no celular dele 7 vezes antes que ele atenda. Ele lhe responde:
-Oi. Tô na esquina.
Ela dirige até lá, ele entra no carro, não conversam durantes os 5 minutos do percurso até a casa dele. Ele explica o caminho pois ela nunca havia ido até lá. Ele lhe dá um beijo rápido no rosto e desce dizendo:
-Valeu.

Alternativa C-)
Ela se levanta, troca de roupa, pega a chave e sai, com a mãe ligando atras, perguntando que loucura é essa de sair esse horário. A noite está um pouco fria e vazia. Percorre os quilometros até que rapidamente. Chega no lugar xis e ele entra no carro.
-Ai, não quero nem ver o que a minha mãe vai dizer disso... Vou ter de ouvir reclamações durante meses por sua causa.
-Desculpa. Estou tão mal, ela é tudo pra mim, não sei o que farei sem ela, ela tem de me perdoar, tentei ligar nesse meio tempo, mas ela não atendeu.... - e continua sua ladainha o percurso todo.
Explicado o caminho, chega ao destino. Antes de descer, olha para os olhos dela e diz:
-O que foi?
-Nada...
-Bom, então, valeu. - E vai embora.

Alternativa D-)
Ela se levanta, troca de roupa, pega a chave e sai, com a mãe ligando atras, perguntando que loucura é essa de sair esse horário. A noite está um pouco fria e vazia. Percorre os quilometros até que rapidamente. Chega no lugar xis, ele entra no carro. Enche o ar com cheiro de alcool. Assim que ela dá partida, desliza a mão sobre a sua no cambio até a perna.
Param em um semaforo. Ela olha pra ele. Ele se projeta a frente e a beija. Ela se surpreende nos primeiros 5 segundos, gosta nos proximos 2, se dá conta do que está acontecendo nos 3 seguintes. Ele se precipita, a envolve com gestos vulgares e apressados.
Ela se desvencilha e se recusa a parar em mais nenhum sinal vermelho. Sua vontade é abraçá-lo e deitar a cabeça em seu peito, mas não existe essa opção.
Chegam até a casa dele. Ele dá tapinhas em seu ombro e diz:
-Valeu, moça.

Alternativa E-)
-Vou ver o que posso fazer....
Desliga a ligação... Pensa por 30 segundos. Seu desejo de ir até ele é grande, fantasias se formam em sua mente sobre um possivel e positivo acertar de contas. Senti-sua-falta, fique-comigo, preciso-de-você, todas essas expressões aparecem quando fecha os olhos. Uma lagrima desliza em seu rosto. São lembranças, fatos e palavras reais, se sobrepondo a todas as ilusões. De novo não...
Pega o celular e digita não-posso-ir-.-o-metro-abre-daqui-a-pouco-.-me-avisa-quando-chegar-.-sorry-.-bjos. e envia o sms. Depois desliga o aparelho. Não dorme o resto da noite.
Na manhã seguinte, ao ligar novamente o celular, recebe uma mensagem dele e imagina, ao ler, o tom ironico que ele deve ter empregado.
'Valeu pela ajuda.'



Isso nunca será.

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

(Ouvindo Santa Maria de Gotan Project)

Tira o cabo do fone de ouvido e conecta às caixas de som. Um gole de vinho. Não tem copos suficientes em casa, mas fez questão de ter taças para todos. Remexe os ombros no ritmo da música. Percorre o corredor de quatro passos até o quarto, espreme-se dentro do vestido preto e pensa 'oh, céus, preciso emagrecer'.
Ainda com a taça pela metade se olha no espelho, só um rímel está bom. Ajeita de leve o cabelo.
Vai até a sala, apaga as luzes diretas e acende os três abajures incandescentes. A temperatura de cor da sala cai. Desliza até a porta de correr da sacada e a abre completamente. Uma brisa fraca entra, faz balançar suave as persianas.
'ah, o gelo!'
Pega o celular e digita coração-,-pode-trazer-gelo-por-favor-?-vem-logo-bjo e envia. Junta todas as almofadas da casa e joga no chão da sala. Ele logo lhe responde afirmativamente.
O tango moderno a embala e ela se sente feliz. Da janela vê o carro estacionar perto da portaria do prédio. Descem três amigos. O interfone toca. 'Fala pra subir, obrigada.'
Conta alguns segundos, antes de tocarem a campainha, já está próxima a porta e pode ouvir suas vozes. Olha pelo olho mágico e gira a maçaneta.
Chovem 'ois' e beijinhos, já avisa de primeira 'vamos todos fazer a noite dos cochichos, chega de multas pelo barulho'. Todos riem cúmplices, daquela forma que amigos fazem ao se lembrar de histórias familiares.
'eu trouxe rum! Mojitos!'
'haha, você é louco. Trouxe um vinho. Aliás, taças, taças!'
A cozinha já é conhecida e se sentem livres para abrir o armário e se servirem do vinho que já está aberto sobre a bancada.
'E o que vai ser hoje? Baralho ou vamos acabar no jogo-da-verdade?'
Risadas.
O interfone toca novamente. Ela nem se mexe, as próprias visitas atendem. 'É ele'.
Mais segundos, mais campainhas. Cumprimenta os próximos três a chegarem e a ele por último. E o beija na boca demoradamente por causa da saudade. Os amigos fazem uivinhos e zombarias. Eles se abraçam carinhosamente.
'ele chegou com o gelo, êêê, por isso merece recepção tão calorosa!'
Todos estão na cozinha se servindo, apenas o casal está na sala.
O tango.
E é natural. Abraçados balançam no ritmo não cantado enquanto se olham no olhos. São senti-sua-falta e tive-saudades falados baixinhos, mãos dadas e narizes se tocando quase sem querer.
Os outros encontram desculpas para se demorarem no outro cômodo, dar uns instantes de privacidade ao casal antes de acabar com a pieguice.
Os dois acabam chegando a tal bancada em busca do tal vinho antes de serem interrompidos. Reabastecem as taças e chamam todos para a roda de almofadas.
Os amigos vão, fazendo gracinhas, já tem suas almofadas preferidas. Logo surgem frases saudosas.
'estamos velhos, bebendo vinho numa noite de sexta.'
'nos tempos aureos estariamos bebendo vodca pura antes de uma balada forte.'
Silêncio. Goles sendo tomados, conclusões sendo feitas. Pensamentos sobre do que foi feito das pessoas e seus destinos.
'Nunca fomos tão felizes.'
E concordam.

terça-feira, 1 de abril de 2008

Ela era minha tia favorita. E da minha mãe também, visto que foi a escolhida pra ser minha madrinha. De todos os seis daquela casa, se ela não estivesse lá quando o visitávamos, a visita não estaria completa. Ela tinha muito jeito com criança. Ela tinha muito jeito com todo mundo. Ela fazia amizade com o leiteiro, com o carteiro, com o motorista do ônibus, com a enfermeira, com a feirante... Ela era a simpatia em pessoa. Tinha um sorriso contagiante e uma voz gostosa de ouvir (roubei sua frase, Jr.), dava vontade de perguntar, tintim por tintim, todas as coisas que aconteceram na vida dela, só pra ouvi-la contar... Ela me comprava canudinhos de biju recheados com chocolate quando eu era criança.

Ela era vaidosa, sempre passava batom e eu ficava fascinada com aquele batom verde que ela tinha, que mudava de cor.

Ela tinha milhares de anotações na sua agenda, de contas, de encomendas, de telefones de amigos... Ela fazia transações bancarias mais complicadas do que a minha mente consegue imaginar mesmo com 78 anos de idade...

Ela foi tecelã quando na época diziam que negros não podiam trabalhar em tecelagem porque ‘suavam na mão’ e manchavam o tecido. Mas ela não.

Ela não se casou e não teve filhos. Na verdade, nós fomos seus filhos.

Quando fui pra Bauru fazer faculdade, me afastei um pouco daquela parte da família, por falta de tempo mesmo pra ir visitar quando estava aqui. Então quando os via, não tinha assunto, fiquei desacostumada com todo mundo...

Mas então eu voltei pra casa. E ela adoeceu. E nas 5 semanas que ficou no hospital, eu fui lá fazer companhia quase todos os dias. E então retomamos mais forte do que nunca a nossa amizade. Ela me contou coisas que eu antes era criança demais pra saber. Ela me contou da sua infância e da competição de canteiros que ela e suas irmãs tinham... E dos porquinhos que elas davam nome e banho todos os dias, e choravam quando viravam comida...

No dia em que íamos buscar o resultado do exame pra saber o que ela tinha, eu chorei de medo enquanto dirigia.

Foram quase 2 meses desde a confirmação até a sua partida. Nesse tempo a doença já foi nos prevenindo. Ninguém vive para sempre e uma hora isso certamente iria acontecer. E a cada agravamento, nós sabíamos que essa seria a causa, só não sabíamos quando.

Eu cruzava a cidade e enfrentava congestionamentos pra buscá-la a cada sessão de quimio. E depois a levava de volta. Todas as vezes.

Eu via que a situação teria esse fim, não menti pra mim mesma. Vivi os cinco estágios e tive forçosamente que passar pro ‘aceitação’.

Então era uma despedida, estava chegando a hora de dizer adeus.

Nos últimos tempos, eu tinha até vontade de evitar o contato porque era incomodo demais ver como ela estava debilitada, tendo sido a pessoa independente e forte que foi. Mas nós somos uma família. E nós somos a família dela.

Ontem de manhã, quando soubemos, nos conformamos, não queríamos prolongar mesmo o sofrimento dela. Ela se foi. Foi triste.

Porém, o momento mais triste foi quando meu irmão ajudou a levar o caixão dela e eu o vi chorar como nunca havia visto, quando vi as lagrimas dele cairem na tampa de mármore...

E muitas pessoas foram se despedir dela, porque "quem não gostava da ’tia Límpia’?"

Ela se foi. Às vezes parece irreal saber que não vou mais ver as mãos dela (e tenho tão viva na mente a lembrança dessas mãos de quando era criança). Queria que meus filhos pudessem conhecê-la.

Ela era minha tia preferida. Eu choro escondido enquanto olho fotos de nós duas.

Tchau, Tia Madrinha.

quinta-feira, 13 de março de 2008

Tentei, mas não consegui....
Queria expressar o que sinto agora, mas as palavras faltaram, são dedos demais e teclas de menos para serem digitadas...
Fascina-me. Enche-me de orgulho. Faz com que eu tenha vontade e confiança pra dizer.
E é tão suave e delicioso. Com semi-suspiros e sonhos inocentes...
Quase quero que nunca termine. Quase quero que dure pra sempre...

quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

É, Juliana, agora é a hora.

Eu passei tempos colocando a culpa de várias coisas da minha vida em 'obstaculos' que chegaram ao fim.
Finalmente é 2 de janeiro de 2008.
Primeiro faltava terminar esse ultimo ano, depois faltava me mudar de volta pra São Paulo, depois falatava pintar meu quarto, desfazer minhas caixas e malas, rearrumar meu guarda roupa. Tá que ainda faltam caixas e que o meu guarda-roupa precisa ser remontado, mas e agora?
As festas de fim-de-ano passaram, hoje eu vou começar um regime e o processo de readaptação-na-casa-da-mãe não está sendo facil, mas não tenho como esperar mais.
Quantas vezes eu não disse ano passado que a minha vida estava me esperando, que Bauru de certa forma estava trancando as minhas possibilidades, que eu não via a hora de estar de volta pra poder dar continuidade a minha vida?
Quantas vezes eu não disse que não queria me envolver com ninguém nesse ultimo semestre porque a distancia seria inevitavel e eu não estava disposta a procurar sarna-pra-se-coçar?
Bom, então, agora, Juliana, qual o discurso que você tem pra mim?

Pois é. 2008 chegou e 'it's the time of my life', 'it's time to move on'. E as minhas resoluções pra esse ano são:

1- Emagrecer.
Vou começar por esse ponto porque hoje (dia 2) começo um regime revolucionário (aham) e é o meu objetivo talvez mais imediato: é urgente.

2- Me formar.
Entenda por esse ter sucesso na ida a Bauru dia 23 de fevereiro com as outras 20 pessoas na mala, fazendo todo mundo feliz com o minimo possivel de estresse familiar, estando linda (e por isso a resolução numero 1) e me divertindo horrores.
Nesse item ainda mereço destacar:
2.1- Arranjar uma roupa pra usar pois ainda não tenho nem ideia.
2.2- Arranjar um penteado e
2.3- Arranjar um cabeleireiro pra fazer o que eu quero (e uma manicure e um maqueador)

Já estou até imaginando: 340km, 5 horas de viagem pra ir e mais 5 pra voltar, sei lá quantos graus de calor e personalidades nada faceis, isso vai ser f*da. Talvez o pior já tenha passado nesse sentido, mas ainda temos pano pra manga.

3- Obter satisfação na minha iminente mudança de visual.
Amo as minhas tranças mas creio que está na hora de inovar (ainda mais que posso recorrer a elas sempre que precisar). Tenho várias ideias de como gostaria que o meu cabelo ficasse e varias decepções no curriculo, então estou bem pé no chão. A verdade é que estou morrendo de medo pois 3 anos cultivando esse cabelinho-que-mamãe-me-deu não foram 3 dias e esse leque de possibilidades que tenho podem acabar num só golpe de tesoura ou numa pincelada de qualquer formulinha magica. Bom, pelo menos quanto a isso estou encaminhada pois minha hora no cabeleireiro está marcada pra terça (mesmo que essa hora seja apenas pra uma conversinha amistosa pois duvido muito que já saia de lá 'renovada') e metade das minhas tranças já foram pro lixo. Desejem-me sorte.

4-Fazer o TCC até junho e colar grau dia 22 de agosto.
O meu tcc não esta encaminhado, apesar de já saber do que irá se tratar. Preciso tomar vergonha na cara, fazer cadastro em uma boa biblioteca e responder os emails da minha orientadora. De todas as resoluções 'profissionais', essa é a que tenho mais certeza de concluir. Tipo-assim, não existem possibilidades de não entregar o tcc em junho, esse é o objetivo mais numero-um do meu ano. Preciso me formar, não quero nada pendente com a UNESP.

5- Estagiar.
Todas as minhas forças e good-vibrations estão concentradas nisso. Eu definitivamente vou arranjar um estágio nesse primeiro semestre. E para isso:
5.1- Montar um portfólio decente. Tenho que parar pra organizar tudo que tenho, ver o que realmente vale a pena, arrumar o que não estiver valendo, fazer um intensivão html-flash-actionscript-e-afins, comprar um dominio, arranjar um kit designer (adobe) e um consultor de sites (hahaha). Publicar coisas na web, fortalecer meus contatos, comprar uma pasta de couro pros momentos mais convencionais (isso inclui também impressões caras em graficas rapidas) e me jogar.
5.2- Fazer freelas pra galera. Aí, gente, se precisar de serviço de designer, me chamem. A principio coisas pra amigos porque não é só da academia que vive um portfólio. E depois é só me contratarem mesmo.
5.3- Sair por aí mandando curriculos, batendo de porta-em-porta, dando a cara pra bater.

6- Evoluir pra trainee.
Com algumas ideias em mente, preciso rever os conceitos de resmat, economia e fisica experimental, conseguir umas boas notas, me formar logo, contar com a sorte e conseguir realizar o plano mais ousado do ano numa manobra perfeita. (E VOU conseguir)

7- Guardar dinheiro.
Tendo conseguido os itens acima, quero me policiar e guardar o que eu puder. Pra uma coisa mais imediata, quero viajar pra visitar o Neo em 2009. Pra uma coisa mais longuinqua, quero comprar um carro (isso que dá se acostumar com luxos, ainda mais que esse ano meu irmão faz 18 anos, vai ser uma disputa enorme pelo carro da mamãe), uma casa, ter meu primeiro milhão aos 30 anos.

8- Conhecer pessoas.
Tanto no quesito vida-pessoal quanto profissional, preciso de pessoas novas. Colegas de trabalhos, networking, amigos. Preciso enriquecer minha rede social.
8.1- Não que eu não goste dos amigos que tenho mas, convenhamos, as pessoas com quem mais me identifiquei na vida estão espalhadas pelos quatro cantos desse estado... Aqui em Sampa estão minhas amigas old-fashioneds que eu amo mas que a vida já nos trouxe a caminhos diferentes e somos tão diferentes que não nos entendemos mais tão bem quanto antes. Quero arranjar novos amigos. Não que isso signifique me livrar dos velhos, mas bem sei que pra cada setor do cotidiano se encaixa uma personalidade e tenho algumas lacunas.
8.2- Contatos profissionais. Contatos profissionais. Contatos profissionais. Isso inclui toda a 'massa designer' que eu já conheço que era estudante e agora vai virar categoria. Indispensavel!
8.3- Ah não, esse merece um tópico só pra ele.

9- Achar o futuro homem da minha vida.
Estou tendo inclinações ultra-romantescas e quero ter alguém pra despejar todas as bajulações, miminhos e carinhos que estive guardando. Quero arranjar um amor mesmo. Todas as romanticisses piegas como usar aliança, chamar de benzinho, ganhar flores e tudo mais. E se não for pedir demais, quero que seja A pessoa pra vida toda, alguém que coloque a prova todas as coisas que eu acredito, me contrarie e me convença. Se quiser se chamar Daniel, ficarei mais ainda satisfeita. :)

10- Passar o proximo Ano Novo de um jeito mais legal.
Sempre passo com a minha familia mas pra 2008-2009 que me divertir horrores, custe o que custar, signifique o que significar.

11- Me libertar de ideias mediocres que nunca me levaram a nada.
(me limito a esse comentário nesse quesito)

12- Me divertir!
Não vou dizer muito pois esse ano tenho que focar na carreira e não posso debandar, mas me divertir o máximo possivel.

13- Assistir mais filmes.

14- Ler mais livros.

15- Conhecer lugares que ainda não fui.

16- Comer comidas que ainda não comi.

17- Usar sapatos de salto alto no cotidiano.
Quero ser mais mulherzinha e menos menininha, dar um descanso pro allstar, apesar de também querer um novo, e usar sapatos mais sociais e condizentes com a pessoa que quero me tornar. (Sou designer e vivo sim de aparencias)

18- Recuperar meu sotaque paulistano (, meu).

19- Adquirir o habito de passar protetor solar.

E... Sei lá...

O fato é que agora estou meio perdida. Tem um comichão exigindo que eu me mexa mas ainda não consegui escolher o primeiro passo (mas fazer essa lista me ajudou!)
Mantendo sempre o pensamento positivo que vi n'O segredo, minha ultima resolução é cumprir todas as resoluções.

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

Faltam dois meses e poucos dias pra minha vida dar uma nova reviravolta.
Dessa vez eu tenho menos medo. Como há quatro anos, quando o futuro era uma incognita e as previsões quase impossíveis. A única certeza era de que as pessoas se distanciariam.
E tudo é semelhante.
Por ja ter vivido uma situação como essa, minha coragem está dobrada.
Não nego que foi dicifil, mas reconheço as vezes precisar me esforçar pra lembrar quais foram os meus sofrimentos. E hoje parece que nem doeram tanto quanto eu sei que doeram.
Mas eu sobrevivi.
E vou sobreviver com maior facilidade dessa vez.
O mais irritante é essa contagem regressiva. É o meio termo entre o aqui e o lá que está trancando as minhas possibilidades até 31 de dezembro de 2007.
Tem tantas coisas a serem feitas, tantos planos esperando pra ser colocados em prática...
Não suporto mais a espera. Quando me concentro no presente, no tal 'aproveitar os ultimos momentos', bate um marasmo... Entretanto, quando a ansiedade toma conta de mim, eu só penso em ir embora, em tocar tudo pra frente, em me lançar num mundo totalmente desconhecido, em dizer 'beijobeijomeliga' pras pessoas e sair em busca de novas.
Quando se tem um prazo, fica mais facil de suportar os defeitos de quem convive com você, mas a cada episodio torna-se mais gritante o mantra 'quero que tudo isso acabe logo'.
É uma grande contradição. Vão dizer 'sentirá saudade'. Vou mesmo? Eu não sinto saudade de antes e, sinceramente, acho que serão poucos os pontos de saudosismo. Existe sim um sentimento nostalgico. Pra mim reina o 'foi bom enquanto durou' porque as peças simplesmente não se encaixam mais.

sexta-feira, 27 de julho de 2007

Quem lê esse blog? Só eu? Se sim, eu posso dizer o que quiser, posso dizer pra mim mesma o que eu admito não admitir pra ninguém. Isso é uma falha minha? Talvez não. Tenho muito claro pra mim mesma certas coisas que definitivamente não são da conta de mais ninguém, só minhas, guardo pra mim, são todas minhas, só minhas. Deixando de lado o pronome possessivo, quero fazer um post.


Estou feliz. Estou alegre. Sai do meu estado de infelicidade (que já diversas vezes expliquei como penso), pra uma alegriazinha da mais gostosa. Ela é como um zumbidinho no ouvido de tão pequena. De tão singela. Entrou em mim como centimetros de pele se encontrando num abraço, ficou como o perfume deixado de alguém... E reaquece minha alma a cada coisinha como plaquinhas de msn, mensagens de celular, dedinhos que se tocam no sofá.... E eu estou feliz. E me permito. Se posso aprender com a vida, tenho certeza que essas pequeninas sensações são o que fazem valer a pena. E me deixo sem medo porque se me ilude, e mais do que nunca (mais do que nunca mesmo) eu quero ser iludida, não me importa. Eu gosto disso que vejo quando fecho meus olhos. Eu gosto da longinqua esperança (e pela primeira vez eu me permito ter esperança) que se colore mesmo mantendo tão sisudamente os pés no chão... Ai, eu gosto... E é como eu achei que seria e como eu nunca tive. E o passado é passado, 'os outros são os outros e só', 'o passado não vale mais nada', 'os outros eram manjericão' e eu sou só eu mesma e não consigo expressar com palavras diferentes a diferença tão grande que se faz aqui dentro e acabo falando coisas que eu já disse antes... "Conta para mim, qualquer coisa assim sobre você, que explique a minha paz..."

terça-feira, 5 de junho de 2007

Pai


Esse assunto tem martelado aqui. São tantos os motivos pra me desculpar, pra esconder o verdadeiro, aquele que eu sempre tive medo de sentir.

Pai. Durante muito tempo considerei a hipotese de nunca me sentir mal quanto ao relacionamento com o meu pai. A coisa toda nem é tão complicada assim, na verdade é tudo simples, suponho, sou eu a emaranhar sem necessidade.

Eu não consigo me lembrar da ultima vez que falei com ele ao telefone. Muito menos quando o vi... E de tempos pra cá tenho sentido uma coisa que nunca senti em toda a minha vida: saudades dele.

Eu não me lembro da época em que era apegada a ele, quando ainda era um bebe e dormia na barriga dele no sofá... Quando me levava pros jogos de futebol e eu assistia de dentro do carrinho enquanto um amigo dele ficava ao meu lado. Eu não me lembro de morrer de medo dos fogos de artificio na virada do ano quando estavamos na praia, sentada, encolhida, nos ombros dele. Mas está tudo isso aqui dentro de mim.

Mais tarde, aprendi logo a viver sem ele, já que seu trabalho o levava para cidades fora de São Paulo por semanas. Hoje imagino o que sentiria a minha mãe naqueles períodos.

Depois disso veio o dilema da separação, o fim do casamento... Sem entrar em detalhes, assumi o posto de capitã de uma fortaleza e construi uma muralha entre nós.

Ele é sem dúvida a causa do meu ceticismo quanto ao amor, quanto aos homens, quanto a tantas outras coisas...

Não que antes disso tudo fosse as mil maravilhas, sempre houve tantos pontos de divergencia...

Mas agora, eu nem consigo me recordar quais eram eles...

Eu continuo respeitando-o como meu pai, como imagino que todos os pais deveriam ser respeitados, nunca levantei a voz ou fiz algo para insulta-lo. Se ele disser algo que eu não gosto, não falo nada, afinal, tenho em mim a caracteristica de acreditar que cada um pensa o que quiser, o que foi levado a pensar, o que sua vida lhe mostrou... Não tento mudar a opinião de ninguém, isso inclui a ele.

Porém, ele não sabe nada da minha vida. Ele não sabe o que eu faço ou deixo de fazer, das minhas necessidades, meus amigos, minha faculdade... Não peço permissão a ele quando vou viajar (na verdade não peço mais a minha mãe também mas tudo isso se deve a um grande caminho em direção à liberdade da vida adulta que assumi desde que fui morar fora de casa), não conto quando estou doente, qual livro estou lendo, quem estou namorando...

Isso durante muito tempo não fez diferença, até facilitou muitas coisas, na verdade... Tudo o que eu não queria era um pai me condenando pelas roupas que eu queria usar ou me impedindo de sair com quem me desse vontade.

Eu sei bem que isso não significa que ele não me ama ou não está nem um pouco interessado na minha vida. Sei que tudo isso é resumivel a duas palavras: confiança incondicional. Ele confia em mim incondicionalmente, sabe que sou responsavel, sabe que tenho juizo... Nunca pediu satisfações sobre coisa alguma, nem sobre o dinheiro que me mandava nem nada. Não existem cobranças.

Talvez ele não se sinta no direito de cobrar nada de mim porque eu sempre lhe dei a impressão de estar em falta comigo.

E hoje eu compreendo.

De uns tempos pra cá eu tenho sentido uma coisa estranha. Era uma não-saudade de uma coisa que eu nunca tive. Eu vi tantas outras pessoas e tantos outros pais e tive vontade de que o meu pudesse ter sido diferente. Mas estava conformada com o fato de saber que isso nunca havia sido de outra forma, saber que nem todas as pessoas são iguais, me contentar por nunca termos brigado ou qualquer outro incidente que nos entristecesse seriamente.

Alguns novos incidentes, entretanto, trouxeram aquele medo que eu sempre tive medo de sentir. Arrependimento. Arrependimento precoce de imaginar que um dia eu posso chorar por nunca ter tentado mudar.

Mas ao mesmo tempo, como? Faz quase dois anos que não nos vemos e somente agora sinto saudades, somente agora caiu a ficha...

Ele não mora em São Paulo, eu praticamente não moro em São Paulo... É tudo tão longe...
Eu gostaria de pelo menos poder ter contato suficiente pra saber o que nos levou a essa distancia abissal.

Nunca em toda a minha vida eu tive coragem de expressar a falta que ele tem feito. Nunca... Eu tentei conversar sobre isso vez ou outra mas quem está aqui pra isso?

Não sei o que querer, o que pretender... Não posso dizer que irei nascer de novo, iremos nos redimir plenamente, mas quero poder acreditar.... Quero poder ir aos seus churrascos, quero poder apresentar pessoas importantes pra mim a ele, quero ver suas palhaçadas... Quero ouvi-lo cobrar a benção que eu sempre peço só depois dele cobrar... Quero rir com ele, assistir jogo de futebol na tv com ele, quero ter fotos com ele, quero ter ele na minha vida novamente.
Temos tempo ainda, me alegra, temos tempo ainda pra mudar isso tudo. Me alegro.


(só não sei por onde começar)

quinta-feira, 31 de maio de 2007

Obra de ficção

Ela abre os olhos e sente aquele perfume. Recorda que ao deitar, foi o ultimo cheiro que sentiu.
Durante todo o dia, aquele aroma a cerca, se uma virada brusca o faz dissipar por simples minutos, é quase certo que um quê qualquer o trará de volta.
E é bom. É o melhor que já sentiu na vida. E tem medo do vicio, mas ao mesmo tempo não tem medo. E pensa "Mas é tão dificil..." e tem vontade de chorar... Mas percebe que não, que na verdade é fácil... E todas as coisas do mundo conspiraram pra que as rosas, as violetas, damas-da-noite, todas flores, ficassem subjugadas a esse perfume. Completamente subjugadas a ESSE perfume.

quarta-feira, 2 de maio de 2007

Tem dias merecedores de posts clichês...

Pergunto-me o que são as pessoas na minha vida...
Divagando por uma em especial, talvez essa seja uma das pessoas mais importantes e também das mais complicadas.
Foi assim, foi de outro jeito, é saudavel e doentil...
Demais pro meu ser humano involuído acreditar que sim, a distância nos faz bem. Mata-me de medo e apreensão o futuro, quando as distâncias forem mais curtas e as desculpas mais esfarrapadas.
Porém, não há como negar a ligação cósmica, telepática, extra-sensorial que nos une. Passo dias sentindo a sua falta e quando o tenho, poucas coisas me chateiam e eu penso se não devia tê-lo abandonado há quase quatro anos...
Os segredos tantos que tenho, o limite entre os impublicáveis e os pouquíssimos que permito revelar, é nele que se dá. Nas noites insones, nos dias tristes, no meio das lágrimas, do álcool, da diversão, é pra ele que o meu celular toca. Quando a plaquinha do msn sobe com o seu nome, não há como não sorrir singelamente.
Por ele já me humilhei, já mudei o modo como pensava, já tive crises... Ele já me viu bonita, feia, magra, gorda, feliz, chorando, indo embora sem dizer tchau, querendo ficar pra sempre...
Só por ele eu me esforçaria nesse momento pra curar todos os males possíveis. Só nos problemas dele que me perco as vezes. Só por ele me anularia por alguns segundos, pra que ele ficasse feliz, satisfeito... Só ele encaixaria a cabeça no meu ombro pra que eu fizesse carinho no seu cabelo...
Por mim? Por mim ele se atrasa, muda de opinião, de lugar, joga a culpa na tecnologia, me irrita, me decepciona, me faz chorar e ter momentos depressivos como esse, quando me vejo exigente demais, pessimista demais, colocando-o num altar mais alto do que ele se coloca na minha vida... Então ele me liga, me beija (de longe), me conforta, me ouve, me faz acreditar que há esperança, me considera, me ama, me confunde, me faz voltar atrás, me convence...
E tudo isso é tão mais forte do que qualquer relacionamento carnal que é seu o bibelô que olho todos os dias no meu criado mudo. E eu posso odiá-lo como nunca odiei mais ninguém só porque o amo mais ainda.
E só porque o amo mais, entristece-me igualmente cada um dos nossos tropeços.

Eu sei que sou extremamente imperfeita, que nas horas mais significativas da minha vida coloco peso demais nos seus ombros (sem ainda deixá-lo consciente disso) e tomo como ofensas coisas tão desvalorizadas especialmente por ele.... E me condeno por isso. Até estabeleço para mim mesma que a pena a ser paga é tira-lo da minha vida... Pena essa que já não cumpri uma vez, que até hoje me alcança os calcanhares em certos momentos, mas que talvez seja dura demais porque a minha vida hoje é impossivel de ser prevista sem ele por todo o tempo que nos resta. Porque talvez eu não mereça ser condenada com uma pena tão dura quanto essa.

Faço tempestade em copo d'agua, sou a personificação do superlativo, mas isso inclui meus sentimentos.

E o amo de tal forma incompreensivel que dedico a ele um post dos mais cliches, naquele momento situado entre a decepção eterna e a satisfação eterna pra dizer que eu não acho explicação nenhuma pra nós dois.

Só sei que o amo e quero pra sempre.

(E foram poucas as vezes na minha vida que pude dizer com tanta propriedade e coragem e completa certeza a conjugação desse verbo)
Exatos um mês atrás eu resolvi fazer uma lista da coisas que me irritavam, está salva no modo rascunho o inicio dela...
Mas depois eu percebi que seria tão extensa, tantas idas e vindas, conclui, na verdade, me irritam as pessoas.
Essa frase resume absolutamente tudo.