sexta-feira, 29 de dezembro de 2006

Era um mulher normal. Nem branca nem preta, trabalhava, estudava, tomava conta da própria vida e só gostava de fofoquinhas inocentes de vez em quando. Saia pra baladas de madrugadas multicolores com as amigas, bebia um pouco de alcaloides e alucinógenos. Corria todos os dias de manhã e jantava frutas e verduras saudaveis. Sem traumas de infancia frondosos, sem fobias gritantes, no maximo um medo de baratas.
Nunca poderia se imaginar quais sonhos a assombravam durante a noite, quais pensamentos arrepiavam sua pele. Mas é possível mergulhar fundo em sua psique e revelar muito mais do que ela gostaria. Não queria esconder, tinha na verdade pouca consciencia disso e nenhum propósito de expressar.
Gostava mesmo era de marcas na pele. Não cicatrizes feias e deformidades. Gostava de tatuagens estratégicas e, ah, adorava, vergões passageiros. Chupões suaves em lugares de pouca visibilidade em si mesma. Gostava de marcas cumplices, feitas no calor da paixão, mordidas carinhosas nas costas, vermelhidões sofregas de beijos ardentes, mãos firmes e musculos apertados. Soltava as palpebras levemente de excitação com essas demonstrações sensuais de desejo.
E imaginava sozinha no escuro da noite, que se fosse um homem, adoraria ver em sua companheira, pequenos arranhões de unhas ou mesmo hematomas pequenos de trombadas corriqueiras. Porque admirava as mulheres dificeis e independentes, mas isso seria um pequeno sinal de fragilidade numa personalidade forte, demonstração da delicadeza feminina.
Quando se cortava com a faca ou colocava um band-aid numa bolha causada por um sapato, sentia-se mais atraente, mais mulher. Quando batia o braço numa maçaneta, exibia com orgulho e propósito a mancha esverdeada. Uma bituca de cigarro encostada na pele poderia ser o registro de uma noitada bem sucedida, um motivo pra se gabar ou um assunto pra ser desfiado. Ou até um motivo pra xingar ou reclamar no caso de um humor mais rabugento ou uma madrugada repleta de acontecimentos indesejados.
Encarava-os possivelmente como um histórico, traços da personalidade, dos caminhos percorridos, as tragédias pessoais, os obstáculos vencidos. Era uma biografia esparsa em pequenos icones complexos de serem decifrados.
E sentia inveja das peles mais sensiveis que facilmente adquiriam seu troféus, chegando ao ponto de se perguntarem como os conseguiram.
Não permitiria jamais os excessos sadomasorquistas, não chegaria perto de um chicote, não pediria para apanhar na cama, nem ter cera quente derrubada em seu corpo. Muito menos empunharia qualquer objeto que pudesse machucar seu parceiro nem mesmo se permitiria dar socos ou tapas, beliscões ou qualquer gesto que considerasse violento.
Não era esse o seu fetiche. Era outro, muito mais sutil e complexo.
Era uma maniaca. Era uma tarada inconsequente. Era uma mulher criativa. E era, absolutamente, uma romantica.



Cair da escada e ficar com um hematoma gigante no braço me fez parar pra pensar. E a minha imaginaçao continua sendo fodástica.

quarta-feira, 8 de novembro de 2006

Está ventando e eu sinto frio. Eu gosto. Eu sempre procurei, fui na direção da janela, da sacada, da porta, da fresta.... Eu quero o vento do 18° andar batendo no meu rosto. E me consola. E me comove.

São cinco da manhã mas não há sinais de amanhecer. Tudo está escuro e dormente. Eu ainda não dormi. Eu fiz de tudo, eu assisti, eu ouvi, eu fechei os olhos e pensei, eu tentei, tentei de novo e não consegui. Avassaladora é a insonia. Muito mais para os que tem imaginação fertil como eu. Inspiradora é a insonia. Muito mais para os que tem boa memoria como eu. Se antes a insonia era até poética, hoje é solitária.

E a cada movimento no relógio eu me lembro de similares, genericos e paliativos. Eu não quereria. Mas quem consegue me conter? E vago pela mente, pelas cores, pelo passado irreversivel e irremediavel. E me lembro que sempre fui insone. E que a cada época eu tinha um bom motivo pra pensar. Na verdade um mau motivo.

E eu posso imaginar todo tipo de besteira sentimental, vingativa, cetica, displicente. Mas eu não quereria. Se me conheço, e conheço, é apenas momentaneo, mas parece uma eternidade. Os vidrinhos coloridos da minha prateleira estão prestes a cair, desabar todos eles sobre a minha cabeça. Enquanto eu mesma não processo um novo vidrinho, me assombram os velhos.

sexta-feira, 6 de outubro de 2006

"Libera em meu organismo dopamina.Confunde meus sentidos como analgesicos. Prende-me como anestesia.Porque eu sei bem que me machuca, que me corta... Mas permito. E ainda formiga-me os lábios, assim, quase cócegas.Mas permito. Terei inchaço, terei restrições, terei cicatrizes... Mas permito.Coço a cabeça numa tentativa frustrada de compreender.E compreendo. Apesar de não crer.Então fecho os olhos e suplico que sua persuasão me convença. Imploro. E espero.Dessa forma, cenarios coloridos surgem. Palavras soam pseudo-ardentes (ainda estou cética). Minha boca de repente tem vontade de sorrir e de dizer as coisas mais insanas e convencionais (ainda). Por favor, eu penso, por favor, continuem, eu vou cuidar de cada ferida, eu não reclamarei de nenhuma má sensação, mas coloquem em mim esse novo sopro, eu preciso dessa esperança."

Eu disse que não ia reclamar. E não reclamei. Eu cuido eu mesma de todas as minhas feridas e as cicatrizes já são quase imperceptíveis. E querendo ou não, por mais que doa agora, eu não me arrependo e agradeço sempre a mim mesma por ter registrado pra mim mesma (e eu encontrei aqui parte do meu centro e parte das respostas pras minhas perguntas), pra mim mesma, o que eu senti. Porque sentimentos são voláteis demais. E eu preciso prende-los num vidro e colecioná-los numa prateleira pra poder contabiliza-los mais tarde.
Só porque eu gosto de contabilizar o meu proprio passado. (e talvez eu tenha internalizado um pouco dessa esperança)
Doeu. Doeu mesmo. Eu não queria admitir, mas toda a felicidade e euforia que eu tava sentindo sumiu muito rápido. E nem as músicas que eu gosto de ouvir me tiraram a sensação.
E eu ainda me pergunto por quanto tempo?
O meu unico consolo é saber que eu estive sempre certa, eu estive e estou certa o tempo todo. Eu já sabia de tudo isso. Eu continuo sendo uma ótima adivinhadora dos finais.
E me faz bem nunca ter tido outras ilusões. E saber desde o inicio que seria assim.
Eu sempre soube.
Eu dito e vocês, pessoas meramente previsiveis, executam.
Eu sempre soube.



*Pergunta pouco filosofica: quanto tempo demora pros vestigios físicos de uma pessoa desaparecerem por completo de sua vida? Todos os pelos, fios de cabelo, celulas, tecidos, fotos, e-mails, livros...?
E já nem me pergunto mais dos vestígios emocionais e psicológicos.

sexta-feira, 22 de setembro de 2006

Condenem-me os humánitários mas a rodoviaria de Bauru é um show de horrores.
Toda vez que eu preciso pegar o ilustrissimo ônibus do Prata e chegar com sei-lá-quantos minutos de antecedencia naquele lugar, fico pensando no que encontrarei. Sentada naqueles banquinhos já esperei horas por uma vaga e já vi coisas que não fazia questão.
Dessa ultima vez, uma mulher gordinha e morena, descabelada, pedia dinheiro pra comprar pão. Eu já estava me preparando pra dizer que não tinha moedas (o que é verdade, visto a condição de universitária mal-remunerada que me encontro), quando ela olhou pra mim e, passando reto, sustentando o olhar, elogiou o meu cabelo. Simpatississima. Outra era uma mulher que distribuia lapiseiras com uma mensagem dizendo que era surda e fazia aquilo pra trabalhar. O que me faz pensar que tudo aquilo é um circo é a forma como cada parte do cenário, cada figurino é montado. A tal surda, e não duvido de que era mesmo já que conversava enfaticamente com alguém pela linguagem de sinais, empurrava um carrinho de bebê com um menininho de pouca idade. Ela tinha que levar o suposto filho pra lá? Bom, não conseguiu me convencer com esse truque barato, eu não compraria a caneta nem que tivesse o tal 'um real'.
Em outra ocasião, um senhor me pediu uns cebolitos que eu estava comendo. Eu dei alguns. Ele pediu mais, eu dei mais uns. Mas ele não se satisfez, queria o pacote inteiro. Desculpe, meu senhor, mas eu estava morrendo de vontade de comer cebolitos e por ninguém eu deixaria de fazer isso. Tá, que me custava dar meus salgadinhos pra ele? Mas ele também não podia ter feito aquela cara dele de reprovação, afinal, eu já estava repartindo a minha comida com ele e nem foi de tão má vontade.
Vendendo hora balas de goma, hora panos de prato, existe um homem sobre uma cadeira de rodas e sem as duas pernas. Muito educado, também.
Com o Centrinho da Usp, é facil encontrar mães com seus filhos leporinos, mas, certa vez, uma mulher tinha nos braços uma criança, juro, sem brincadeiras, verde-azulada. Eu não sei de quais males ela sofria, mas me chocou de um tal forma. Pequena, magrinha, com aparerencia fragilizada, olhos amarelados e aquela cor de pele inexistente. Nem quero imaginar outro desfecho senão que ele hoje esteja curado e com bochechas rosadas.
No auge das minhas aulas de fotografia, tentei tirar uma foto de uma familia que estava sentada nos banquinhos da frente, assistindo programa da Xuxa. Na verdade, o foco era um menininho de uns 2 anos de idade, que olhava pra mim e tentava pegar a minha camera, e a sua irmã, que o pegava no colo e rodopiava enquanto ele se esbaldava de rir. É uma pena que eu não domine muito bem a arte da velocidade e da abertura perfeita e as minhas fotografias não cheguem nem perto do que eu pretendia.
Em um dia péssimo da minha vida, daqueles que parecem encruzilhada de todos os problemas, depois de ter chorado, suspirado e decidido que a melhor solução era fugir daquela cidade, veio na minha direção uma moça de fala calma e com livrinhos na mão. Eu aceitei sua presença pensando que talvez, naquele exato momento, poderia ser alguma coisa que pudesse me ajudar, qualquer coisa... Nem que eu quisesse teria forças pra manda-lá embora. E ela me falou calmamente dos desejos do seu deus, me ofereceus coisas pra ler, falou coisas que eu nem lembro mais o que eram. Não me ajudou muito, é verdade, mas pelo menos eu tentei. E talvez ela tenha ficado satisfeita por ter encontrado alguma alma disposta a lhe ouvir.
Se eu não usasse allstar, já teria recebido alguma proposta dos engraxates. Se eu não tivesse senso de higiene, já teria me arriscado num salgado de qualidade duvidosa daquelas lanchonetes. Se eu não tivesse ótimo dominio da minha bexiga, saberia onde é que se esconde o banheiro, que tipo de papel higienico eles (na melhor das hipóteses) fornecem e quanto eles cobram pra lhe deixar entrar.
Não esqueço também das pessoas que se destacaram pelo modo de vestir, pentear, se portar... Mas isso é assunto deveras futil pra hoje.
Nossa, como faz tempo que eu não posto nada...

segunda-feira, 30 de janeiro de 2006

Eu sinto como se não tivesse mais nada pra fazer aqui. Já fiz todas as coisas que eu queria. Agora só serão reprises, sentimentos requentados, as cores serão as mesmas, só mudarão os tons.
Eu me sinto fracassada, me sinto inutil, me sinto motivo de vergonha.
Eu queria ir embora. Queria que viessem me buscar. Me levassem pra um lugar longe e sem volta. E que ficasse só o meu corpo caído no chão como lembrança do que eu fui.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2006

Eu não preciso de você.

Gelo deixa minha língua mais dormente que seus beijos
Musicas falam palavras mais coesas
Quadrinhos me deixam de melhor humor
Alcool me faz ver em slowmotion
Chocolate produz mais endorfinas
Livros me entreteem mais...
Mesmo assim...
Quero ter as suas mãos entrelaçadas nas minhas.